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Boteclando

Arroz, feijão e macarrão

Miguel Icassatti

27/09/2019 10h52

Estrela da Vila Ipojuca: comercial a R$ 15,00 / Foto: Miguel Icassatti

Há quem diga que a humanidade seja dividida entre os indivíduos que colocam, no prato, o arroz por baixo do feijão e os que dispõem o feijão por baixo do arroz. Os adeptos desse fla-flu gastronômico esquecem-se que existem também os isentões, ou seja, aqueles que posicionam arroz e feijão lado a lado no prato.

Mas o meu almoço de ontem me reapresentou a um quarto grupo, que é aquele composto por pessoas que, ao lado do arroz e do feijão (e não importa a disposição entre um e outro), encontram espaço para encaixar no prato, e posteriormente na barriga, uma generosa porção de macarrão.

Muitos botecos e restaurantes populares Brasil adentro servem a trinca – conforme bem lembrou em junho passado meu amigo Marcos Nogueira, autor do blog Cozinha Bruta, da Folha de S. Paulo, no texto "Arroz, feijão e macarrão: sim, não, talvez ou nem a pau?".

O Bar e Restaurante Estrela da Vila Ipojuca é um deles. Foi o que percebi quando pedi um comercial de costela (R$ 15,00), cuja descrição no cardápio mencionava apenas arroz, feijão, costela e salada. Surpresa!, veio o bônus do punhado do espaguete à bolonhesa. E, na sequência, um bem recheado pastel de carne frito na hora, que havia pedido como entrada (R$ 6,00).

Decerto, foi por causa das minhas raízes mineiras por parte de mãe que o breve incômodo que senti ao ver a mistura foi substituído por uma acalentadora nostalgia. Em minha casa, sempre havia panelas de arroz e de feijão sobre o fogão. O almoço de domingo, solene com a presença de alguma visita, era dia de macarronada. Mas se um tio quisesse se confortar com o arroz e o feijão da minha avó, que era da dona cozinha, não faríamos desfeita.

Comercial de costela: o macarrão veio de bônus / Foto: Miguel Icassatti

Talvez esse breve relato doméstico exemplifique um ritual repetido na casa de muitas famílias de origem simples, que por sua vez estabeleceu nos botecos a presença do trio.

Pode ser também que a combinação, carregada no carboidrato, seja uma necessidade nutricional dos trabalhadores braçais, que compõem fatia importante da freguesia desses estabelecimentos.

Confesso que prefiro apenas a dupla feijão com arroz no almoço e talvez uma sopa de macarrão com (pouco) feijão ao jantar.

Mas, se reconheço o valor de um bolinho de feijoada, quem sou eu para recusar de um prato de arroz, feijão e macarrão?

Vai lá:

Estrela da Vila Ipojuca. Rua Tonelero, 1091, Vila Ipojuca.

(Em tempo: sou dos que colocam feijão por cima do arroz.)

 

 

 

 

Sobre o autor

Miguel Icassatti é jornalista e curador da Sociedade Paulista de Cultura de Boteco. Foi crítico de bares das revistas “Playboy” (1998-2000) e “Veja São Paulo” (2000), editor-assistente e um dos fundadores do “Paladar/jornal O Estado de S. Paulo” (2004 a 2007), editor dos guias “Veja Comer & Beber” em 18 regiões brasileiras (2007 a 2010), editor-chefe do Projeto Abril na Copa (Placar) e da revista “Men’s Health Brasil” (2011 a 2014). É colunista de “Cultura de Boteco” da rádio BandNews FM e correspondente no Brasil da “Revista de Vinhos” (Portugal).

Sobre o blog

Os petiscos, as bebidas, os balcões encardidos, as pessoas e tudo que envolve a cultura de boteco e outras histórias de bar.