Campos do Jordão sem a muvuca do Baden Baden: o inverno da tristeza
A tristeza me pegou depois de 123 dias de convívio com as anormalidades já decorrentes da pandemia. Já havia sentido desânimo quando soube do fechamento de uma série de bares e restaurantes dos quais gostava. Fiquei com raiva e revoltado quando vi gente descumprir a simples obrigação de usar corretamente uma máscara e guardar uma distância segura dos outros. Convivo com a compaixão e a admiração pelos profissionais da saúde, entre eles uma pessoa muito querida na família, que contraiu o covid-19 e voltou o trabalho para ajudar a cuidar e a salvar vidas daqueles que são considerados do grupo de risco. Como tantos, ela está todo esse tempo sem contato pessoal conosco.
Mas a tristeza me pegou, pra valer, na sexta-feira passada, quando vi os bares e restaurantes do centrinho do Capivari, em Campos do Jordão, alguns fechados, outros com atendimento a meia-porta. As fotos que acompanham este texto falam por si.
Nunca fui habituê de Campos do Jordão. Em outros invernos, parecia-me um programa de índio a subida da Serra, o trânsito pesado na estrada, a tarifa alta dos hotéis, as temperaturas muito baixas e a longa fila de espera nos restaurantes e bares, em especial o Baden Baden.
As mesinhas no calçadão em frente ao famoso bar da cervejaria, sempre lotadas, simbolizam Campos do Jordão tanto quanto o Véu da Noiva, o teleférico, o Pastelão do Maluf e o Festival de Inverno. A fila de espera por um lugar era, a bem dizer, parte do programa de ver-e-ser-visto. E conseguir uma mesa logo ali na fila do gargarejo era como alcançar a sorte grande.
Neste julho de 2020, a água gelada continua a jorrar do Véu da Noiva mas o teleférico jordanense está inativo, o Festival de Inverno foi adiado para 2021 e o Pastelão do Maluf vem dando, ah vá, seu jeitinho com o delivery: o cliente encomenda o pastel no balcão e aguarda o salgado na praça, onde será entregue por um funcionário, que grita o nome de quem fez o pedido.
Mas não há sequer uma mesa posta defronte o Baden Baden, para ser disputada pelos clientes. A área está isolada por uma fita plástica. Dos 50 garçons que corriam para atender a multidão, restaram empregados uns dez, apenas, que ficam ali na área à espera de pedidos para viagem.
Num único feriado em julho de 2019, por exemplo, Campos do Jordão, que tem 51.454 habitantes (dados de 2017) recebeu 200.000 turistas e 45.000 veículos. Os 14.000 leitos dos 236 hotéis e pousadas tiveram 100% de ocupação e boa parte dos 5.000 leitos disponíveis em casas de temporada também foram preenchidos. Para uma cidade cuja economia depende muito do turismo no mês de julho, esses números podem dar uma ideia dos prejuízos.
Nos fins de semana, é verdade, Campos do Jordão tem recebido mais turistas mas o movimento está muito longe do de invernos passados. A cidade está na fase laranja do Plano São Paulo, o que implica, por exemplo, no horário reduzido de atendimento no comércio em geral e permite que os hotéis trabalhem com 40% de sua capacidade para receber os hóspedes. A projeção do setor, porém, é de que o movimento corresponda a 10% do ano passado.
Se de um lado esses estabelecimentos estão operando aquém da capacidade, é fato que a reabertura parcial, desde 1º de junho, trouxe a reboque a multiplicação de casos de covid-19: até aquela data a cidade computava 34 casos. Na sexta, 17 de julho, eram 289 casos confirmados e há, segundo a prefeitura, 217 ocorrências suspeitas.
Exceto pela breve incursão ao centrinho do Capivari na sexta-feira, mantive-me junto da família o tempo todo, em paz, em casa. Mas, na noite de sábado, pude ouvir o som alto de uma banda que tocava ao vivo em algum lugar na vizinhança, que é repleta de casas espaçosas, algumas cinematográficas. Era uma festa. Mas festas e eventos que geram aglomeração seguem proibidos. Dá raiva, não dá?
Por outro lado, ainda não consigo definir o sentimento diante da notícia da carteirada do desembargador na orla de Santos.
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