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Boteclando

Chef se reinventa na pandemia e vende 2 toneladas de costela por semana

Miguel Icassatti

02/10/2020 04h00

Celso Frizon: 2 toneladas de costela por semana e 10 novos funcionários / Fotos: reprodução

No fim da tarde de domingo, 22 de março de 2020, o chef Celso Frizon encerrou o expediente no Dr. Costela, à beira da Rodovia Régis Bittencourt, em Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo, com uma preocupação imediata: como faria dali em diante para garantir o emprego dos 40 funcionários do restaurante, sem saber quando voltaria a receber clientes?

Na véspera, o governador João Dória havia decretado a primeira quarentena em São Paulo, e somente os serviços essenciais poderiam ficar abertos no estado. O novo coronavírus já havia feito as primeiras vítimas no Brasil e as estatísticas do setor de gastronomia davam conta que muitos bares e restaurantes teriam de encerrar as atividades em definitivo por causa da impossibilidade de trabalhar durante a pandemia. "Restaurante é uma fábrica de passivos", diz Celso Frizon que, diante do cenário viu-se obrigado a acelerar algumas ideias que estavam adormecidas.

Não foi a primeira vez que Frizon teve de adaptar-se às circunstâncias. De origem gaúcha, ele chegou a São Paulo nos anos 1990, estacionou a caminhonete na saída da Rodovia Régis Bittencourt para Embu das Artes e começou a vender suco de uva e vinho de garrafão. Alguns anos depois, inaugurou no quilômetro 293,5 da mesma rodovia o Rancho do Vinho, mistura de empório e restaurante especializado em carnes e que foi o primeiro em São Paulo a ter uma carta de vinhos exclusivamente com vinhos do Rio Grand do Sul.

Entre as receitas preparadas por Celso no Rancho do Vinho, a porchetta alla romana e a costela assada no fogo de chão faziam sucesso e atraíam cada vez mais clientes, que chegavam ali graças à propaganda boca a boca. Atento a isso, ele não hesitou e transformou o Rancho do Vinho em Dr. Costela.

Já em tempos de redes sociais, intuitivamente Celso Frizon passou a promover a casa nas redes sociais, postando vídeos e fotos no Facebook e no Instagram, nos quais aparece quase sempre diante da churrasqueira a deslizar suavemente a faca sobre nacos de carne suceulenta. Em plena pandemia, os resultados começaram logo a aparecer: graças a essa estratégia de overposting – invariavelmente são mais de dez postagens diárias –, no dia 21 de maio o perfil do Dr. Costela no instagram chegou a 100.000 seguidores. Hoje, são 142.000.

O serviço de delivery de costela, com alcance para bairros das zonas Oeste e Sul de São Paulo, além de cidades próximas, como Osasco, Embu das Artes e Itapecerica da Serra, também tem sido bem-sucedido. "No dia das mães, tive de contratar oito motoboys só para fazer a entrega", lembra o chef.

Mas a ideia do delivery, por si só, não seria capaz de sustentar o restaurante mesmo após a reabertura do salão, que é ainda é parcial. Naquele mesmo mês de maio, quando a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) apontava que 57% dos estabelecimentos já haviam demitido funcionários e que 40% encerrariam as atividades de vez, Frizon acelerou uma ideia que iria ajuda-lo de vez a afastar-se das estatísticas ruins.

Costela assada no fogo de chão: à moda gaúcha / Foto: divulgação Dr. Costela

Desde 2017, o Dr. Costela vinha tentando criar uma costela assada na brasa que pudesse ser congelada e vendida para os clientes finalizarem em casa sem muito esforço. Fez diversos testes, colocando mais ou menos sal grosso, assando com e sem osso, mas acabou abandonando a ideia. Até que a pandemia o estimulou a retomar os planos. Sem dinheiro para investir, recorreu a um amigo, dono de um pequeno frigorífico, que lhe emprestou equipamentos para resfriar, embalar e congelar a carne – já que o preparo da costela, temperada apenas com sal grosso e assada na brasa, não poderia mudar.

Depois de muitos testes, Frizon chegou ao ponto que queria, voltou ao Instagram e passou a divulgar a novidade e o método de preparo: a singela técnica de banho-maria, que permite à costela preservar o sabor, a maciez e a suculência. Uma semana após a primeira postagem, o chef assou 300 quilos de costela. Na semana seguinte, mais 700 quilos. Um mês depois, o Dr. Costela já estava assando 2 toneladas desse corte.

Para dar conta da demanda, Celso Frizon teve de contratar mais dez funcionários e terceirizar o processo de embalagem desse corte. Além de vender a costela congelada diretamente para os fregueses – por 93 reais a porção de 1 quilo e 59 reais a de meio quilo, nas versões tradicional e com queijo – , ele fornece o produto a cerca de 25 lojas e restaurantes de cidades como São Carlos, Campinas, Santos, Limeira e Guarujá.

Dois dias atrás, o Dr. Costela apresentou "mais uma novidade", como ele próprio diz, no instagram: o cupim mexicano congelado, corte cujo preparo é idêntico ao da costela. No que depender do chef e garoto-propaganda, vem mais overposting por aí.

Vai lá:

Dr. Costela. Rodovia Régis Bittencourt, quilômetro 293,5, Itapecerica da Serra.

Sobre o autor

Miguel Icassatti é jornalista e curador da Sociedade Paulista de Cultura de Boteco. Foi crítico de bares das revistas “Playboy” (1998-2000) e “Veja São Paulo” (2000), editor-assistente e um dos fundadores do “Paladar/jornal O Estado de S. Paulo” (2004 a 2007), editor dos guias “Veja Comer & Beber” em 18 regiões brasileiras (2007 a 2010), editor-chefe do Projeto Abril na Copa (Placar) e da revista “Men’s Health Brasil” (2011 a 2014). É colunista de “Cultura de Boteco” da rádio BandNews FM e correspondente no Brasil da “Revista de Vinhos” (Portugal).

Sobre o blog

Os petiscos, as bebidas, os balcões encardidos, as pessoas e tudo que envolve a cultura de boteco e outras histórias de bar.