Não é o Doria: o que eu e você podemos fazer para que os bares não morram?
Na quarta-feira, 27 de janeiro, um grupo de cerca de 300 empresários e trabalhadores do segmento de bares e restaurantes realizou uma manifestação pacífica na Avenida Paulista, em São Paulo, contra as medidas mais restritivas de circulação, determinadas pelo Plano São Paulo, a autointitulada "estratégia do Governo do Estado para vencer a covid-19, baseada na saúde e na ciência". Foi a segunda manifestação do setor em cinco dias: no dia 22, uma quantidade menor de gente havia protestado nos arredores do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo do estado de São Paulo. Essas ações, assim como a campanha nas redes sociais "Não nos confundam", que faz referência aos bares e restaurantes que vêm seguindo os protocolos e, portanto, não estariam espalhando o coronavírus, foram organizadas pelo Movimento Gastronomia Viva e têm apoio da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) e da ANR (Associação Nacional de Restaurantes).
Não há dúvidas de que os negócios da "alimentação fora do lar", ou seja, os bares, restaurantes, cafés, padarias e congêneres formam um segmento da economia que está entre os mais afetados pela pandemia, depois apenas, talvez, da saúde pública. O alvo preferencial dos apoiadores do movimento vem sendo o governador do estado, João Doria, que a todo momento se diz amparado pelo comitê de especialistas em saúde para embasar suas decisões, como a mais recente, a de restringir os horários de funcionamento de bares e restaurantes de segunda a sexta até 20 horas e, nos fins de semana, somente com atendimento via delivery.
O problema não é o Doria. Ou, ok, não é apenas o Doria. Na mesma linha do colega paulista, o governador do Pará, por exemplo, anunciou ontem novas restrições naquele estado. E é preciso dizer que o comitê de especialistas do governo de São Paulo vem defendendo um lockdown faz tempo. Voz dissonante, eu também defendo. Ontem foi o terceiro dia com mais mortes por covid-19 no país. Diferentemente do presidente, eu estou com medo de morrer ou de perder gente querida. É um momento que exige sacrifício de todos.
A meu ver, a questão dos bares e restaurantes é muito mais complexa do que uma simples canetada doriana poderia solucionar. Envolve muitos partícipes, tão próximos e tão distantes ao mesmo tempo uns dos outros, que insistem em mergulhar no próprio bolso cada vez mais furado em vez de segurar a mão de quem está ao lado para, juntos, buscar alguma solução para os problemas. Bom, já que estou apontando o dedo para muita gente, endereço meu indicador para alguns:
E se o Doria e os outros governadores reduzissem temporariamente tributos estaduais que incidem diretamente nos produtos e insumos utilizados por bares e restaurantes, em especial o ICMS?
E se o ministro Paulo Guedes topasse atender aos três pedidos levados até ele pelos representantes do setor, em reunião ocorrida esta semana? A saber: 1. Extensão do BEM, programa de preservação de emprego e renda, que permite a redução de jornada de trabalho e de salário; 2. Prorrogação da carência do Pronampe (programa de crédito para pequenas empresas); 3. Manutenção dos estabelecimentos inadimplentes no Simples, já que que mais de 60% deles não tem recursos para pagar os impostos atrasados até o fim de janeiro. Se não o fizerem, migram para um regime de tributação mais alta. Hoje, no Simples, pagam 11%. Em outro regime, só de INSS seriam 27,5%.
E se a Abrasel e a ANR se juntassem às associações comerciais dos estados e à Confederação Nacional do Comércio para unir esforços em favor das reivindicações?
E se o prefeito Bruno Covas assim como os prefeitos dos outros 5569 municípios resolvessem dar um bom desconto e/ou postergar o pagamento do IPTU dos estabelecimentos neste ano de 2021?
E se os órgãos responsáveis pela fiscalização dos protocolos aumentassem sues efetivos e fossem rigorosos e ágeis na identificação e na punição dos estabelecimentos que estão furando as regras de combate à pandemia?
E se as empresas de bebidas proibissem os distribuidores e representantes de vender seus produtos para os produtores, promotores de eventos e casas noturnas que sabidamente organizaram e continuam organizando festinhas clandestinas?
E se as mesas no Vaca Véia, no Itaim Bibi, fossem redistribuídas no salão para, de fato, guardar a distância de 2 metros entre si e de 1,5 metro entre os clientes?
E se o Isaac Azar orientasse seus funcionários do Paris6, nos Jardins, em São Paulo, a organizar a fila de espera de modo que os clientes guardem distanciamento físico?
E se a turma do Tuy, também no Itaim Bibi, recusasse o pedido de alguns clientes para dar um jeitinho e colocar mais uma cadeira na mesa já ocupada por seis pessoas, o limite autorizado no momento?
E se mais donos de bares e restaurantes aderissem à excelente ideia da campanha "Jante às 18h", que já tem adeptos como o Piselli, do restaurateur Juscelino Pereira, nos Jardins, o Chez Vous, em Moema, e a Rota do Acarajé, em Santa Cecília? Em outros lugares do mundo, como Nova York, algumas cidades da Itália e na Alemanha, por exemplo, esse é um hábito muito comum. No caso do Piselli, tanto nos Jardins quanto no Shopping Iguatemi, é possível chegar às 17h, pedir um drinque – o aperitivo é por conta da casa – e emendar o "jantar ao pôr-do-sol", que, por sua vez, terá o vinho como cortesia.
E se, nós clientes, aderíssemos à ideia de jantar às 6 da tarde?
E se os aplicativos de entrega reduzissem a taxa de 27% em média, que cobram dos bares e restaurantes, sobretudo os pequenos? Melhor: e se cobrassem uma taxa única, mais baixa; independentemente do porte dos estabelecimentos?
E se os entregadores tivessem um desconto no IPVA de suas motos?
E se as concessionárias de serviços de gás e energia reduzissem o valor cobrado em suas contas?
E se nós clientes respeitássemos as regras ou boicotássemos os bares e restaurantes que não estão nem aí?
E, que tal, se todos nós sentássemos à mesa virtual do Zoom e colocássemos essas e outras perguntas em debate? Quem quiser vir, é só chamar: miguel@culturadeboteco.com.br.
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