Boteclando http://boteclando.blogosfera.uol.com.br Os petiscos, as bebidas, os balcões encardidos, as pessoas e tudo que envolve a cultura de boteco e outras histórias de bar Sat, 12 Jun 2021 16:05:39 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 No dia do gim, 12 motivos para celebrar a bebida http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/06/12/no-dia-do-gim-12-motivos-para-celebrar-a-bebida/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/06/12/no-dia-do-gim-12-motivos-para-celebrar-a-bebida/#respond Sat, 12 Jun 2021 16:03:04 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=972

Negroni com tangerina, da Osteria Del Rosso / Foto: divulgação

Leiden, cidadezinha que fica a cerca de 45 quilômetros de Amsterdã, é uma terra de gênios e de ideias geniais. Ali nasceu em 1606, Rembrandt, gravurista e pintor – aliás, dica: há algumas gravuras dele expostas na imperdível casa-museu da Fundação Ema Klabin, em São Paulo. Alguns anos antes, em 1575, foi fundada a Universidade de Leiden, que atravessa os séculos como uma das instituições de ensino mais prestigiadas do mundo, sobretudo por ser um centro de livre pensar a respeito das ciências humanas e sociais – e onde o gim foi criado.

Leiden mora em meu coração porque na cidade nasceu meu avô, Antonius, que era uma figura e se foi antes que eu tivesse idade para brindar com ele um Dry Martíni, a quem dedico este texto, e também a você, leitor, que aprecia o gim.

  1. O gim foi, por assim dizer, inventado na Holanda. O primeiro registro da produção do destilado de zimbro vem do século 17. Foi nos laboratórios do campus da Universidade de Leiden que o professor Franciscus Sylvius de la Boe destilou bagos de zimbro e produziu a bebida, na época utilizada como remédio para problemas gástricos.
  1. A bebida chegou à Inglaterra levada pelos soldados que combateram em território holandês na Guerra dos Trinta Anos (1618-1648). Obteve tamanho sucesso que nos dias de hoje ainda se associa o gim, primordialmente, ao Reino Unido.
  1. Tanto é que foi na Inglaterra que o blogueiro Neil Houston criou, em 2009 na cidade de Birmingham, o Dia Mundial do Gim, dedicando o segundo sábado de junho à bebida. Desde então, mais de 30 países entraram na brincadeira.
  1. Embora a legislação brasileira permita a comercialização de bebidas com teor alcoólico de no máximo 54%, na Europa são produzidos rótulos mais potentes, a exemplo do Blackwood’s Vintage Dry Gin, que tem 60% de álcool.
  1. Além do zimbro, componentes importantes na composição do gim são os botânicos, ou seja, ervas, flores, frutas e especiarias utilizadas na produção da bebida, que lhe dão indentidade, conforme a marca. O emblemático Monkey 47, elaborado na Alemanha, leva 47 botânicos colhidos na Floresta Negra em sua receita, entre eles coentro, amora, mirtilo casca de laranja e de limão, além de zimbro, é claro. Foi criado pelo aviador inglês Montgomery Collins, em 1950, e cada lote e engarrafado com apenas 2500 garrafas de meio litro. No Brasil, é importado pela Pernod-Ricard.

    Gim tônica do Ritz: Ritz hour / Foto: divulgação

  1. Entre os drinques com gim mais preparados no mundo estão o Dry Martíni, o Gim Tônica e o Negroni. O gim tônica foi inventado por soldados ingleses que serviam na Índia colonial. Como eram obrigados a consumir quinino para prevenir a malária, passaram a misturá-lo com gim e gelo. A receita clássica de G&T leva 50 mililitros de gim, 150 mililitros de água tônica, gelo e uma rodela de limão siciliano.
  1. Coquetel imortalizado por Winston Churchill e Bond, James Bond, o Dry Martíni tem inúmeras versões, a depender da mão do barman. Churchill, porém, bebia gim misturado com gelo e disse certa vez, ao ser perguntado qual a dose de vermute queria: “gosto da presença do vermute na sala, enquanto eu estiver bebendo o meu martíni. E o agente 007 preferia o seu drinque composto de 75 mililitros de gim com 10 mililitros de vermute branco seco, “batido, não mexido”.
  1. Criado pelo barman Fosco Scarselli e pelo conde Camilo Negroni, no Caffè Cavalli, em Florença, Itália, o Negroni clássico leva, em três partes de 30 mililitros, vermute tinto, bitter e gim.
  1. Com o boom da nova coquetelaria brasileira e também em decorrência da pandemia, algumas marcas de gim passaram a comercializar versões desses drinques clássicos em lata ou em doses. A Jungle Gin, por exemplo, lançou a Bitter&Co., grife que tem Dry Martíni e Negroni engarrafados. Outra marca estabelecida nesse formato é a N45. Em parceria com o barman Alê D’Agostino, do Apothék, o Bar Astor lançou um ótimo Negroni engarrafado. A casa acaba de apresentar também o seu próprio gim nacional, o Gim Astor, desenvolvido pela Virga.
  1. Na cidade do Porto, em Portugal, fica um dos bares com a maior carta de gim no mundo: é o The Gin House, localizado na Rua Cândido dos Reis, 70, popularmente conhecida como região das Grandes Galerias. Especializada em G&T, a casa tem mais de 200 marcas à venda.
  2. Assim como ocorre com o vinho em alguns países produtores, o gim tem uma famosa denominação de origem controlada. Trata-se do Plymouth Gin, produzido na cidade inglesa de Plymouth, e é geralmente mais importado que o London Dry Gin.
  1. Leitura obrigatória: Os Segredos do Gim, do expert José Osvaldo do Amarante (Mescla Editorial), foi lançado em 2016 e traz, além da história do gim, detalhes da produção, dados sobre o consumo, receitas de drinques clássicos e uma lista respeitável de bares de gim ao redor do mundo.
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8 motivos para conhecer e celebrar o Dia do Uísque http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/05/15/8-motivos-para-conhecer-e-celebrar-o-dia-do-uisque/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/05/15/8-motivos-para-conhecer-e-celebrar-o-dia-do-uisque/#respond Sat, 15 May 2021 07:00:28 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=960

The Macalann 1926: o uísque mais caro do mundo

Primeiro é preciso esclarecer: na falta de uma, existem ao menos três datas internacionais que celebram o uísque. A primeira delas é 8 de fevereiro, conhecida como World Scotch Day (Dia Mundial do Uísque, criada em 2017 pela Diageo, multinacional dona de marcas como Johnnie Walker, Buchanan’s, Talisker, The Singleton, entre outras. Nessa data, as destilarias do grupo na Escócia, evidentemente, ficaram abertas à visitação até 2020, numa ação que deve retornar em 2022.

Desde 2008, no dia 27 de março comemora-se o International Whisky Day, data de aniversário do escritor e jornalista Michael James Jackson, autor de livros fundamentais a respeito de uísque e cerveja, nascido em 1942.

E a terceira e mais famosa data é o World Whisky Day, em alta desde 2012, que acontece sempre no terceiro sábado de maio (hoje, 15 de maio), data em que as destilarias, os bares e pubs ao redor do mundo criam ações para lembrar a ocasião. Foi criada por Blair Bowman sob inspiração, quem diria do gim.

“Basicamente, eu estava vivendo em Barcelona em 2011 e notei que existia o World Gin Day, com site e tudo. Eu pesquisei ‘world whisky day’ no google e não havia nada. Eu pesquisei esse domínio, que estava disponível, comprei-o e a história decolou”, disse Bowman ao Boteclando.

Além dessa, confira outras curiosidades e novidades para erguer um brinde com uísque neste sábado:

  1. A mais antiga destilaria em operação ininterrupta na Escócia, terra natal do uísque é a Strathisla, que nunca fechou as portas desde 1786. É o berço do Chivas Regal e o uísque destilado ali entre na composição do blend da marca. Ainda estão em atividade ao menos duas mais antigas, a Glenturret (de 1775) e a Bowmore (1779), mas essas duas tiveram períodos de interrupção na produção, como nas guerras.
  1. Em 2019, a Forbes elaborou um ranking com as marcas mais vendidas no mundo em volume. Adivinhe: as quatro primeiras eram produzidas na Índia e um certo Officer’s Choice puxou a lista. Entre os escoceses, a mais vendida é Johnnie Walker, que comemorou 200 anos em 2020. Red Label é o rótulo escocês mais vendido globalmente – a Diageo não revela números.
  1. Em outubro do mesmo ano, uma garrafa do puro malte The Macallan quebrou o recorde de bebida destilada mais cara do mundo. De acordo com o site Drink Business, The Macallan “Fine and Rare” 1926, envelhecido por 60 anos, foi arrematado num leilão por 1,5 milhão de libras (equivalente a 11,1 milhões de reais ao câmbio de hoje). Apenas 40 garrafas foram produzidas desse uísque em 1986, a partir do mítico barril 263. Outras três garrafas de The Macallan estão no top 5 dos uísques mais caros, em companhia de duas marcas japonesas: o Hanyu Ichiro’s Full Card Series (2º mais caro) e o Yamazaki 55 Anos (4º lugar).
  1. E a pandemia, quem diria, terá impacto no preço futuro dos uísques. “Com as destilarias fechando temporariamente devido às restrições da covid-19, e a desaceleração da produção, prevê-se que os barris produzidos em 2020 se tornem alguns dos mais raros e valiosos no futuro”, diz a Whiskey and Wealth Club, uma empresa que investe em uísques envelhecidos. No início de 2020, segundo a empresa, um colecionador que havia comprado nos anos 1970, por 11 libras, uma garrafa de The Macallan Single Malt 1937, vendeu por 2700 libras em um leilão.
  1. Quem estiver disposto a pagar quatro dígitos em reais por um uísque, o mercado brasileiro traz algumas opções. A mais recente delas é o Port Charlotte 10 Anos, que acaba de chegar às gôndolas. É originário da emblemática Ilha de Islay, que abriga nove destilarias e é a mais meridional do arquipélago de Argyll, na Escócia. Envelhece em barris de carvalho americano e francês e tem preço sugerido de R$ 1.689,57.
  1. Na casa dos dois dígitos, há boas opções, sobretudo porque alguns supermercados e lojas virtuais estão com promoções neste sábado. Um exemplo é a rede St. Marché, que vai aplicar até 35% de desconto em algumas marcas. Um lançamento que tem preço sugerido em R$ 84,90 é o Johnnie Walker Blonde, destinado à coquetelaria.
  1. Por falar em coquetelaria, segmento que vem cada vez mais se aprimorando no Brasil, com técnicas, ingredientes e barmen de alto nível. O movimento “Plus Two”, encabeçado pelo uísque The Singleton (12 anos), traz a sugestão de preparo do uísque com mais dois ingredientes, todos na mesma proporção e elaborados diretamente no copo. Um exemplo é o “Plus Coffee”, que leva 50 mililitros de uísque, e as mesmas doses de café coado e refrigerante de cola. Despeje num copo baixo com muito gelo, misture, decore com um ramo de hortelã e… Slainte! Saúde!

The Singleton Plus Coffee: uísque e coquetelaria

 

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Segurando as pontas, empresários investem em restaurantes mesmo na pandemia http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/05/06/segurando-as-pontas-empresarios-investem-em-restaurantes-mesmo-na-pandemia/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/05/06/segurando-as-pontas-empresarios-investem-em-restaurantes-mesmo-na-pandemia/#respond Thu, 06 May 2021 07:00:52 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=951

Consulado Mineiro da Alameda Santos: aberto e crescendo em plena pandemia / Fotos: divulgação

A pandemia mostrou que o dono do boteco mais fuleiro da quebrada e o restaurateur que espalhou suas brasseries e bistrôs nos pontos mais caros das cidades são, antes de tudo, comerciantes. Num cruel contexto como o do Brasil na pandemia, com mais de 400.000 vidas perdidas, 335.000 bares e restaurantes fechados e 1,3 milhão de trabalhadores do setor demitidos, segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), todos os empreendedores da gastronomia vivem as mesmas dores para manter o negócio de pé, pagar funcionários em dia, honrar as contas e garantir o próprio sustento.

Quem vinha mantendo a casa em ordem e havia guardado uma reserva emergencial teve mais chances de se segurar. Aqueles que conseguiram superar a burocracia e ter acesso às linhas de crédito emergencial dos governos federal e estaduais ganharam um respiro.

Infelizmente, esses são a minoria: segundo a Abrasel, 41% dos empresários fizeram o Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte) e outros 33% tentaram mas não conseguiram acesso junto aos bancos. E aqueles que têm calo na barriga e nos cotovelos após anos de trabalho do lado de lá do balcão ainda fazem valer o chavão segundo o qual as crises trazem oportunidades de crescer. É o que pensam dois comerciantes que dobram a aposta neste momento e investem na multiplicação de seus restaurantes. Confira os depoimentos de Giovanni Carneiro, sócio-proprietário da rede Consulado Mineiro, e de José Lourenço dos Santos Júnior, dono do Baião – Cozinha Nordestina e da Pizzaria Paulino:

“Chorei na frente dos funcionários”

Giovanni Carneiro, do Consulado Mineiro: administração familiar

“Quando tivemos de fechar pela primeira vez no ano passado, chamei a equipe toda e literalmente chorei na frente deles. Todo mundo estava com muito medo e eu, como empresário, não sabia como ia ser. E falei: “gente, eu vou segurar o tempo que der. A última coisa vai ser mandar alguém embora”. Há pessoas que trabalham conosco há trinta anos, um cozinheiro que está ali desde o início, uma equipe fiel e talentosíssima, que veste a camisa.

A primeira coisa foi cortar a retirada dos sócios: não tem lucro, retiramos o mínimo para sobreviver. Naquele primeiro momento o que ajudou muito foi a MP 936 do governo federal, reeditada agora (que permitiu, entre outras coisas, preservar o emprego por meio da redução de salários e carga horária), porque ela pagou parte dos salários, reduzimos 50% da carga horária. E o delivery nos salvou. Sabíamos que iria crescer e, após o decreto do fechamento dos bares e restaurantes, contratamos mais dois motoboys. Nós trabalhamos com aplicativos, usando a plataforma só para receber pedidos, mas temos entrega própria.

O fato de já ter delivery ajudou muito. Quem começou do zero penou porque é outra operação, embalagem, logística… Durante a semana trabalhávamos com um motoboy, agora são quatro. Em fim de semana eram de cinco a sete, mas quando o tempo também ajuda – com comida mineira, o movimento aumenta nos dias de frio e nos fins de semana com chuva – são de dez e 12 motoboys em nossa matriz, na Praça Benedito Calixto, em Pinheiros.

Empréstimo e aluguel mais barato

Ter essa estrutura ajudou, mas a gente pegou empréstimo no Pronampe – nem todos conseguem – e também com o DesenvolveSP, do governo de São Paulo, que está com taxas bacanas. E isso permitiu investir. Tem um tempo que a gente vinha pensando em abrir uma casa nova. Meu tio sempre quis a região da Avenida Paulista, primeiro pelo fluxo de pessoas e também porque era um sonho dele, porque sempre morou ali desde que chegou a São Paulo, vindo do interior de Minas Gerais.

Só que era muito difícil encontrar um ponto comercial ali e, quando existia algum disponível, era um absurdo o valor do aluguel. Com a pandemia, estão sobrando pontos e pode-se tratar da locação diretamente com o proprietário.

Abrimos uma unidade num ponto no qual, antes da pandemia, provavelmente não conseguiríamos estar (Alameda Santos, 1107, entre Rua Pamplona e Alameda Campinas). É um lugar muito bom, em área nobre. Hoje estamos no meio de duas casas que estão para alugar. Negociamos direto com o proprietário, que nos contou que, 10 anos atrás, alugou o ponto para a Kopenhagen, que deu a ele 400 mil reais de luvas e aportou ainda 1 milhão de reais em uma construção nova. A gente não teria como investir se não fosse neste momento.

Prato executivo do Consulado: sem inventar moda

É triste, muita gente perdeu seus negócios, seus empregos, perdeu a vida”

A gente vinha estruturado por termos uma administração familiar – eu, meu irmão, meu tio. Na nova unidade, minha sobrinha vai ser a gerente, temos sempre a família envolvida.

Nossa reserva financeira foi importante porque quem já está com a corda no pescoço, numa crise dessa não consegue segurar mesmo. Contratamos oito pessoas para a casa nova e espero contratar mais quatro a seis. E não mandamos ninguém embora.

Esta segunda onda de agora está mais difícil, porque o movimento do delivery caiu 20% em relação ao ano passado. Mas não vamos inventar muito. A gente quer que as pessoas que conhecem o Consulado Mineiro passem por ali e se identifiquem com esse novo ponto, que entre e se sinta como se estivesse na casa da Benedito Calixto, que é a de mais sucesso.

É hora de segurar as pontas, a pandemia vai passar e o comerciante que sobreviver com seu negócio vai colher bons frutos porque, quando isso tudo passar, as pessoas vão estar sedentas por bares e restaurantes. Esteja com a casa preparada para receber o público que vai ter retorno, vai recuperar o tempo perdido”

Giovanni Carneiro, do Consulado Mineiro

“Já estamos pesquisando outros bairros para abrir mais unidades”

Júnior, do Baião e da Pizzaria Paulino: momento bom para apostar

“Quando foi anunciada a quarentena em março de 2020, a minha decisão foi dar férias de 15 dias para todos funcionários do Baião. Antecipei até as férias dos que ainda não tinham direito e mantive só dois cozinheiros por causa do delivery, que na época era muito devagar.

Eu imaginava que seria um fechamento de poucos dias e, como isso não aconteceu, eu dei férias por mais quinze dias, e depois desse 30 dias, como o comércio não abriu, coloquei os funcionários que trabalham no salão como garçons e barmen no plano do governo de suspensão de contrato de trabalho até o mês de agosto.

O Baião arcou só com os salários dos cozinheiros, pois o delivery, depois de muita propaganda e promoções, aumentou bastante.

Pedi um desconto no aluguel no período que estávamos fechados e o proprietário do imóvel reduziu o valor em 40%. Fiz uma redução de gastos no geral, mas o maior problema foi com a Enel e a Sabesp, que não faziam leitura e mandaram as contas pela média.

Não tínhamos nem pra quem reclamar, achei isso um absurdo. Não cheguei a demitir ninguém, mas tive três funcionários, que eram do Nordeste e moravam sozinhos aqui em São Paulo, que ficaram com medo da doença e pediram pra sair e voltar junto da família, com medo de perder os pais por causa do vírus.

Baião no CTN: oportunidade em plena pandemia

Quando as coisas voltaram a abrir, a dona do CTN (Centro de Tradições Nordestinas) foi ao meu restaurante e me convidou para abrir uma unidade lá. Fui conhecer o local e achei uma boa, acreditando em uma volta rápida do movimento e dos shows. E foi o que aconteceu, cheguei a faturar 25 mil reais em um domingo, mesmo com o número de clientes reduzido, mas depois vieram mais restrições após as eleições e o movimento voltou a cair, até voltar para a fase vermelha – essa, sim, ainda mais difícil.

Mas com o fechamento de muitos restaurantes, muitos pontos bons e já com a estrutura montada para restaurante ficaram vagos. Foi aí que resolvi pegar um ponto na Vila Madalena, a ser aberto em breve, porque acredito num retorno de movimento rápido, pois as pessoas não aguentam mais ficar em casa e também pelo fato de terem fechados muitos bares e restaurantes.

O valor médio de aluguel no bairro era de 20 mil a 22 mil reais mas eu consegui negociar por 10 mil no primeiro ano e depois vai para 14 mil. Teremos de 30 a 35 funcionários, que vão se juntar aos 35 que já temos entre as unidades do Pacaembu e no CTN, onde ainda trabalhamos com cerca de 15 freelancers nos fins de semana.

Ponto do futuro Baião na Vila Madalena: descontão no aluguel

Também abrimos uma filial da Pizzaria Paulino na Rua Carlos Weber, na Vila Leopoldina, no meio da pandemia, em julho de 2020. O valor do aluguel antes era de 8 mil reais e eu consegui baixar para 5 mil. E vai para 7000 a partir do segundo ano, mas é um ponto pequeno.

A intenção era atender no delivery mas os clientes começaram a pedir mesas no salão e conseguimos colocar uns 30 lugares. Foi um sucesso, começamos com mais de 100 pedidos por dia e este mês estamos fazendo mais um forno porque um não está dando conta da demanda. Já estamos pesquisando outros bairros para abrir novas unidades. O momento é bom para quem quer alugar pontos comerciais”.

Lourenço dos Santos Júnior, do restaurante Baião e da Pizzaria Paulino

 

Vai lá:

Consulado Mineiro Alameda Santos. Alameda Santos, 1107, Cerqueira César.

Baião Cozinha Nordestina. Rua Jacofer, 615, Limão (Centro de Tradições Nordestinas).

Pizzaria Paulino. Rua Carlos Weber, 1530, Vila Leopoldina.

 

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Pubs reabrem no Reino Unido. Enquanto isso, a gastronomia agoniza no Brasil http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/04/16/pubs-reabrem-no-reino-unido-enquanto-isso-a-gastronomia-agoniza-no-brasil/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/04/16/pubs-reabrem-no-reino-unido-enquanto-isso-a-gastronomia-agoniza-no-brasil/#respond Fri, 16 Apr 2021 07:00:58 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=937

Pessoas aproveitam pubs reabertos no Leadenhall Market, em Londres (Crédito Mike Kemp/In Pictures via Getty Images)

No dia 21 de junho comemora-se o Dia Internacional do Aperto de Mão. A data também marca em 2021 o início do inverno no Hemisfério Sul e o começo do verão no Hemisfério Norte. Graças ao Solstício, nós que estamos ao sul da linha do equador teremos o dia o mais curto e a noite a mais longa do ano, enquanto na parte de cima do planeta será o oposto: o dia será o mais longo e a noite a mais curta do ano. E o 21 de junho marcará especialmente o Reino Unido, pois essa é a data na qual todas as restrições ao funcionamento dos pubs serão levantadas, depois de um ano e meio de pandemia.

Conforme mencionei aqui mesmo no blog, os pubs representam o símbolo maior da identidade britânica, razão pela qual eu arrisquei-me a escrever, em julho de 2020, que a reabertura dos pubs àquela época, antes da segunda onda global das contaminações do covid-19, era a melhor notícia possível.

Tal como aconteceu no verão passado, na segunda-feira, 12 de abril de 2021, milhares de súditos da rainha Elizabeth II correram aos pubs logo no primeiro minuto do primeiro dia em que as regras foram afrouxadas. Desta vez, felizmente, não vimos as cenas de aglomeração pelo SoHo londrino, nem gente bêbada tombada pelas ruas. Entre os dois momentos de retomada nos pubs muita coisa aconteceu, muita gente morreu e o Reino Unido parece ter aprendido algo. Tanto é que a decisão de agora ocorre um dia depois do menor número de mortes diárias registradas desde o dia 14 de setembro.

As condições que permitem a atual reabertura são consequência de um conjunto de medidas adotadas pelas autoridades locais, baseadas no tripé: 1. Lockdown de fato; 2. Auxílio emergencial para a população e as empresas – o governo vem arcando com 80% dos salários, em um teto de 2500 libras, aos funcionários que não tenham sido demitidos; e 3. Vacinação: todos os ingleses com mais de 50 anos já tomaram ao menos uma dose da vacina, num total de 40 milhões de pessoas; com isso, mais da metade da população já desenvolver anticorpos contra o coronavírus. E a partir de hoje, que tem mais de 40 anos já pode agendar a sua data de vacinação.

A reatomada de agora ainda é parcial e impõe limitações ao atendimento. O ponto mais importante é a autorização para que pubs e restaurantes sirvam bebida e comida ao ar livre, para grupos de até seis pessoas sentadas – 38,2% dos pubs e apenas 11,9% dos restaurantes da Inglaterra, da Escócia e do País de Gales têm área aberta. É possível que coloquem algum tipo de cobertura mas ao menos metade desses espaços não tenha paredes. Os pubs podem instalar aparelhos de TV para transmissões esportivas, mas apenas do lado de fora – o desafio via ser fazer os torcedores manterem-se sentados e sem gritar na hora do gol. Embora a British Beer and Pub Association estime que cerca de 2000 pubs tenham encerrados as atividades definitivamente durante a pandemia, de um total de 47200 existentes em 2019, a reabertura depois de um lockdown de quatro meses não deixa de ser auspiciosa.

Os clientes maiores de 16 anos também têm suas obrigações: devem informar seus contatos para o caso de haver a necessidade de rastreamento por parte do sistema nacional de saúde; ao levantar para ir ao banheiro, devem usar máscara facial. E convém que os imunizados portem sua carteirinha de vacinação pois os estabelecimentos terão o direito de pedir que lhes seja mostrado o documento. Em 17 de maio, se tudo correr bem, o povo do Reino Unido poderá voltar a comer e a beber em ambientes fechados e nas mesas externas serão permitidas até 30 pessoas sentadas, numa nova fase de afrouxamento de normas até que venha o liberou-geral do dia 21 de junho.

Enquanto isso, por aqui, um cenário como esse parece cada vez mais distante, com a covid-19 tirando dois anos da expectativa de vida dos brasileiros. Bares e restaurantes agonizam, encerrando as atividades de vez. Empreendedores da gastronomia seguem sem o devido apoio das esferas do poder público para manterem-se ativos e garantindo empregos. Os empregados, aliás, vêm morrendo: um levantamento realizado pelo jornal El País com base em dados do Ministério da Economia, mostrou que houve um aumento significativo de mortes entre trabalhadores de certas áreas, numa comparação entre os meses de janeiro e fevereiro de 2020 e 2021. Não é possível cravar que todos os óbitos foram por Covid-19, explica a reportagem, mas pode-se aplicar na comparação o conceito de “excesso de mortes”, usado pelos epidemiologistas, já que a pandemia pode impactar a vida da população a ponto de levar uma pessoa à morte por falta de vaga em um hospital.

Entre os setores tido como essenciais, as mortes entre frentistas aumentaram 68% na comparação entre 2019 e 2020, seguidas pelas de caixas de supermercados (67%) e motoristas de ônibus (62%). Nos dez setores com mais mortes entre um ano e outro, contando aí os não-essenciais, aparecem os trabalhadores do comércio de produtos alimentícios (21,3% de aumento) e os de restaurantes e similares (mais 13,29%).

Até 21 de Junho, que ninguém aperte a mão de ninguém.

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A morte do Genésio: um bar se vai mas sua memória deve ficar http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/03/28/a-morte-do-genesio-um-bar-se-vai-mas-sua-memoria-deve-ficar/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/03/28/a-morte-do-genesio-um-bar-se-vai-mas-sua-memoria-deve-ficar/#respond Sun, 28 Mar 2021 14:46:29 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=928

19.03.2020 – Garçons aguardam clientes no bar Genésio, na Vila Madalena. (Foto: Eduardo Knapp/Folhapress)

Houve um tempo em que éramos felizes e sabíamos, sobretudo nós, jornalistas. Era uma época em que passávamos muito mais do que as 44 horas semanais regulamentares nas redações, em jornadas de 12, 13, 15 horas diárias. Não ganhávamos hora extra, no máximo uma pizza no pescoção, que é como a gente chama a noitada de sexta-feira no trabalho a fim de adiantar a edição dominical e a de segunda-feira do jornal.

Nas noites úteis, por assim dizer, saíamos da redação diretamente para o boteco. Nos meus tempos de jornal e de revista, muitas vezes meu destino era o Filial, na Vila Madalena, às 2 ou 3 da manhã de uma quarta ou quinta-feira, e ali encontrava o que comer (caldo de feijão seguido de uma espetada de alcatra com salada de batata), o que beber (chope, muito chope) e o que conversar, com Jefão, Paulo, Fernando, entre outros véios de guerra sempre a postos. Comprava o exemplar da revista Ocas diretamente da mão do Wilson e, se meu salário tivesse entrado na conta, talvez levasse para casa um vinil do Cartola, do Sinatra ou do Jimi Hendrix, das mãos de outro mascate da noite, o… péra, agora me confundi: Wilson era o vendedor de discos ou da revista Ocas?

A pausa para ir ao banheiro e ativar a circulação dos membros inferiores, no Filial, rendia às vezes uma esticada ao Genésio, do outro lado da rua, para conferir o movimento ou convidar algum comparsa à nossa mesa. Esse vaivém não provocava maiores problemas porque o Genésio e o Filial pertencem aos mesmos donos. No caso do Genésio, pertencia, porque a pandemia o matou.

Segundo uma reportagem do Guia da Folha de 18 de março, em fevereiro o imóvel que abrigou o Genésio por quase duas décadas foi colocado para alugar. Passei muitos bons momentos no Filial e no Genésio (aqui eu preferia me acomodar em uma das mesas montadas na calçada, mais convidativas. Cruzei, num ou noutro, com gente como os irmãos Raí e Sócrates, Billy Duff (guitarrista do The Cult, depois de um show da banda ao qual eu, por acaso, havia ido horas antes) e Joyce, a cantora.

Antônio Calixto, garçom do Genésio, em imagem de 2012. Foto: Julia Chequer/Folhapress)

Genésio e Filial foram dois casos raríssimos, se não forem únicos, os quais, desde a declaração de pandemia, mantiveram-se fechados (exceto por uma breve tentativa de oferecer um serviço de delivery), em respeito aos clientes e aos próprios funcionários, cerca de quarenta, muitos deles veteranos e, portanto, nos grupos de risco.

Ontem um amigo compartilhou no grupo do zap a notícia que outro clássico paulistano também havia batido as botas, no caso, o Finnegan’s Pub, em Pinheiros. Fui checar no instagram @finnegansoficial e li um post que dava conta de que a casa estaria “fechada por tempo indeterminado”. Mandei mensagem pelo próprio app e do lado de lá me disseram que o bar seria reaberto hoje para retirada de produtos no local. O post que eu li havia sido apagado e outros dois já estão no perfil, um deles informando que “estaremos funcionando através de delivery/retirada de quarta a domingo, de 12h30 às 20h.

O Finnegan’s também me traz boas memórias, inclusive uma não-vivida, que virou anedota entre os amigos, um perrengue impublicável, em respeito ao próprio bar. Nos bons anos 1990, o Finnegan’s era o único pub de São Paulo no qual podia-se beber um irish coffee de verdade, com creme de leite batido na hora. Era um tempo em que a cidade tinha poucos e bons balcões nos quais os barmen preparavam drinques clássicos impecáveis, casos do Bistrô (dry martini e bullshot feitos pela dupla Derivan e Souza), do Pandoro (caju amigo do Guilherme, com gim, faz favor) e do Supremo (ah, o manhattan do Rocha).

Torço para que o Filial e o Finnegan’s não se juntem tão cedo ao panteão desse saudosos endereços. E não podemos deixar que as memórias de bar se esvaiam. Refiro-me aqui à lembrança da experiência do que é estar num bar, do que é chamar o garçom, pedir um drinque ao barman, petiscar, mandar um bilhete ou escutar a conversa na mesa ao lado.

O mesmo vale para as redações, que elas voltem a encher-se e tragam boas notícias. Precisamos delas, assim como precisamos deles, os bares.

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“Vou morrer”: fiscal de bares relata pressão em ações de combate à covid-19 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/03/12/vou-morrer-fiscal-de-bares-fala-da-pressao-nas-acoes-de-combate-ao-covid/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/03/12/vou-morrer-fiscal-de-bares-fala-da-pressao-nas-acoes-de-combate-ao-covid/#respond Fri, 12 Mar 2021 07:00:05 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=918

O estado de São Paulo está, atualmente, na fase vermelha do plano de enfrentamento à covid-19, com bares e restaurantes fechados ao público

Nas primeiras horas do sábado, 6 de março, quando todo o estado de São Paulo havia passado à fase vermelha do Plano São Paulo de enfrentamento à covid-19, foram autuados nada menos do que 43 bares, restaurantes e baladas, entre outros estabelecimentos, durante operações realizadas pelo Centro de Vigilância Sanitária estadual em conjunto com a Polícia Civil, a Polícia Militar e o Procon-SP. Todos esses 43 locais ficam na cidade de São Paulo, em bairros como Itaim Bibi, Jabaquara, Moema, Morumbi, Penha, Pinheiros e Vila Mariana, e descumpriam as normas que proíbem aglomerações.

Cada operação nos faz lembrar os desenhos de Tom & Jerry, dada a lógica das perseguições gato-e-rato. Fica-se com a sensação de que sempre haverá mais ratos do que a quantidade de felinos aptos e dispostos a capturá-los. Na verdade, mais do que uma sensação, estamos diante de uma realidade: o descumprimento dos protocolos existe, a quantidade de servidores nas operações é insuficiente, tanto em esfera estadual quanto municipal, e a burocracia, assim como a falta de coordenação e de legislação específica para coibir certas irregulares, impõem dificuldades à fiscalização.

Um exemplo é a competência para atuar e multar os estabelecimentos. Fiscais da prefeitura, por exemplo, verificam o cumprimento do horário de um bar e se ele está com mesas e cadeiras na calçada, o que é proibido atualmente. Já a questão das aglomerações ou da manutenção dos 40% de limite de capacidade, em vigor na fase laranja, é de responsabilidade da Vigilância Sanitária estadual.

O blog BOTECLANDO conversou com um fiscal municipal de São Paulo – o cargo oficial chama-se “agente vistor” – que, sob anonimato, falou dos desafios aos quais profissionais como ele enfrentam atualmente, da precariedade de condições e do dia em que foi ameaçado com um revólver enquanto realizava seu trabalho.

O que faz um fiscal

“Cada subprefeitura tem sua equipe de fiscalização. Os agentes vistores são responsáveis por fiscalizar problemas como barulho excessivo, calçada quebrada, pichação, licença para comércios e publicidade em local proibido. A subprefeitura de Pinheiros tem 1400 processos eletrônicos para serem respondidos. Diariamente chegam ofícios do Ministério Público nos cobrando. Daí pedimos reiteração de prazo, ficamos sujeitos a levar processo. As ações de combate à pandemia são apenas mais um item no nosso trabalho mas, evidentemente, têm a prioridade neste momento, com a fiscalização dos bares, ambulantes e restaurantes quanto aos protocolos contra a covid-19”.

Trabalho, rapa e ameaça

“No dia-a-dia fazemos as rondas. De quinta a domingo são praticamente 12, 13 horas rodando. Fiscalizamos bares e restaurantes, em relação ao cumprimento do horário de funcionamento e, se encontramos algo errado, vamos lá, tiramos foto, para deixar tudo documentado, e autuamos o estabelecimento na hora. Quer dizer, era assim. O trabalho começou a ficar perigoso, porque passamos a receber ameaças de comerciantes e de frequentadores. Passamos a circular com carro branco, sem o adesivo de identificação. Agora, quando vemos algo irregular, fotografamos, anotamos o endereço e só posteriormente entramos em contato para autuar. As operações conjuntas – que reúnem fiscais, GCM, polícia, rapa – acontecem quando ficamos sabendo de festas clandestinas em baladas e rooftops, por exemplo. Tem equipe do rapa posicionada no Itaim Bibi, na Vila Madalena, em várias regiões. Mas são equipes pequenas, não chegam às periferias, que estão largadas ao deus-dará”.

Pontos críticos

“A moçada mais jovem apertou o foda-se faz tempo, está toda na rua. Alguns pontos mais críticos são a Rua Guacuí, em Pinheiros, e a Soares de Barros, no Itaim Bibi, que concentram muitos bares e posto de gasolina. Até que a Vila Madalena vem dando menos trabalho. Houve uma conversa com os donos de bares, um trabalho de prevenção, junto de toda nossa equipe, lá no início da pandemia e durante a fase mais restrita em 2020. Fizemos 75 ações. Isso não é nada, deveríamos ter feito muito mais, mas vejo como resultado as poucas festas ali no bairro. No ano passado estouramos uma festa clandestina na Rua Estados Unidos, com ingresso a R$ 1000. E o que aconteceu? Um dos presentes à festa chamou todo mundo para a casa dele, na Rua Desembargador Mamede, no Jardim Paulistano. Daí só foi lavrado um BO, não havia o que fazer, porque a festa seguiu para uma residência particular. As ruas no entorno ficaram cheias de carros e de seguranças. As festas acontecem também em outras regiões, na periferia, que, a bem da verdade, nunca ‘fechou’”.

Duas décadas sem concurso e poucos fiscais

“Sabemos que a fiscalização é precária. Fiz o concurso no ano de 2002 e, desde então, não teve mais nenhuma seleção pública para agente vistor, que é o nome oficial do cargo de fiscal. Desde o primeiro decreto do Bruno Covas (em março de 2020) para ajustar a cidade ao plano do governo do estado, 160 fiscais foram para casa, por serem do grupo de risco ou terem idade superior a 60 anos. Em São Paulo, na ativa, deve haver no máximo 170 fiscais em todas as subprefeituras. Tem subprefeitura que só tem um ou dois. Na sub de Pinheiros eram dez e a equipe atual soma cinco agentes”.

Pressão

“Quase todos os dias recebemos ofícios do Ministério Público com denúncias, por exemplo, de obras irregulares. Já me chamaram de cuzão, ouço xingarem o Dória de FDP, vi clientes de bar dando chute na porta do nosso carro. É uma relação muito tensa. Os donos de bares estão estressadíssimos. Vi dono de bar chorar na minha frente mais de uma vez. Trabalhamos de segunda a segunda. O prefeito prometeu aumento por causa da carga de trabalho mas, quando foram ver, a legislação impede. É claro que isso criou expectativa, decepção e bronca no pessoal. Falta reconhecimento ao nosso trabalho”.

“Vou morrer”

“Houve uma noite, por volta das 23 horas, em que estávamos eu e o motorista descendo a Rebouças, quando vimos uma aglomeração ao redor de uma barraca de lanches num posto de gasolina. Pedi para o motorista parar, saí do carro, fiz duas fotos “no mocó”, mas algumas pessoas perceberam: por isso, voltei pro carro logo e saímos. Quando paramos num semáforo em um dos cruzamentos adiante, nosso carro foi cercado por quatro veículos, um de cada lado, à frente e atrás. O trânsito parou, um cara veio até mim e me mostrou uma arma. Pensei: “vou morrer”. Quando vi, eram uns seis caras, pegaram meu celular, até que consegui dizer que eu era da fiscalização. Pediram meu crachá, eu mostrei e desconversei, dizendo que tirei foto das placas do posto, que pareciam irregulares. Só assim fomos liberados. O que a sociedade tem de perceber, é que somos um mal necessário”.

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De global pelada na Playboy ao amigo de Che: meus drinques têm histórias http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/02/25/de-global-pelada-na-playboy-ao-amigo-de-che-meus-drinques-tem-historias/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/02/25/de-global-pelada-na-playboy-ao-amigo-de-che-meus-drinques-tem-historias/#respond Thu, 25 Feb 2021 07:00:11 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=912 Numa conversa ao telefone com o chef Eduardo Maya no ano passado, possivelmente num período mais restrito imposto pelas autoridades sanitárias para reduzir o contágio de covid-19, ele deu o alerta: “nós não podemos perder a memória do que é um bar, do que é ir a um bar, beber um drinque ao balcão”.

A crise decorrente da pandemia já havia causado o fechamento de muitos bares Brasil e mundo afora e a preocupação do meu interlocutor, e grande amigo, era genuína. Edu relatou-me o caso da Inglaterra, cuja cena gastronômica era tida, durante mais de meio século, como sofrível.

Esse cenário foi consequência do período das Primeira e Segunda Guerra Mundiais, uma era de muita carestia no Velho Mundo. Faltava comida, faltava água, os bares e restaurantes foram morrendo. Até que, felizmente, nas últimas duas décadas, o país tornou-se um importante polo gastronômico, com muitos estabelecimentos estrelados. Aquela conversa e uma consulta hoje a uma caixa de fotografias motivada por um trabalho escolar da minha filha me fizeram recordar de passagens em companhia de drinques e histórias.

O gimlet do JR. Duran

Era um fim de tarde em meados de 1999 e minha chefe me chamou à mesa dela: “Miguelito, seguinte: o Duran está fotografando agora a capa da próxima edição da revista no estúdio dele, na Vila Madalena, e preciso que você vá entrevistar a moça, agora. Você terá poucos minutos, num intervalo da sessão de fotos, ou ficaremos na dependência de conseguir um espaço na agenda dela nos próximos dias”. A revista era a PLAYBOY, a moça da capa era uma famosa atriz de novelas da Globo, o Duran era o fotografo catalão J.R. Duran. E eu, bem, era um repórter em início de carreira, feliz – e sabia.

Minutos depois, cheguei ao estúdio e lá estava uma equipe do finado programa Vídeo Show, da TV Globo, a registrar imagens para uma espécie de making-of. Era o tal intervalo que eu teria para conversar com a atriz, que estava sendo maquiada no camarim. Fiz as primeiras perguntas e tivemos de dar um tempo para que a moça gravasse mais algumas imagens para a TV.

Fui, então, ao estúdio e comecei a conversar com o Duran, que estava um tanto impaciente com aquela lenga-lenga. Para quebrar o gelo, aproveitei para pedir a ele alguma dica de viagem, comida ou bebida, para eventualmente publicar na revista.

Duran havia acabado de regressar de Los Angeles, onde havia realizado o ensaio com a tal atriz, e me indicou um bar onde tomou um gimlet (acho que era o The Giannini). Ele começou a descrever o drinque – que leva gim e suco de limão –, a relembrar a atmosfera do bar e se empolgou.

Nessa hora, a atriz da capa, a editora de fotografia e a produtora da PLAYBOY retornaram ao estúdio. Ariane, a editora, gentilmente convidou-me a me retirar para que finalizassem as fotos. “Deixa ele ficar aqui, tranquilo”, disse o Duran. E, assim, pude acompanhar pela primeira e única vez na minha vida uma sessão de fotos para a capa da revista PLAYBOY.

Uma tarde em Havana, em La Bodeguita: o clássico lar do mojito / Foto: acervo pessoal

O mojito e o amigo do Che

Em outubro de 2003, viajei a Havana para ser o primeiro brasileiro a entrevistar o bioquímico Alberto Granado, amigo de Ernesto Che Guevara, com quem, quando jovem, havia feito uma viagem de moto pela América do Sul, entre o fim de 1951 e o início de 1952. A viagem rendeu o livro “De Moto pela América do Sul”, uma coletânea do diário escrito por Che, que foi a base para o filme Diários de Motocicleta, de Walter Salles, a razão para a minha entrevista, que seria publicada pela revista da Mitsubishi.

Foram 11 meses de negociação com Granado, que havia me concedido uma hora de conversa, em que pese o fato de eu ter cinco dias em Havana, já que era mais barato, se bem me lembro, o pacote da passagem aérea Copa Airlines e cinco noites de hotel do que um mero bate-e-volta à terra de Fidel.

Já na casa de Granado, uma da primeiras perguntas que fiz foi sobre futebol – no livro, Che conta que eles assistiram a um jogo do Millionarios, da Colômbia, no qual atuava o craque argentino Alfredo Di Stefano – o que fez com que o gelo fosse quebrado. Ao fim dessa hora de entrevista, Granado disse-me: “vamos continuar amanhã?”. Houve o amanhã e o depois de amanhã, num total de 6 horas de entrevista.

No meu tempo livre, passeei por Havana, perambulei por Havana Vieja, recolhi boas histórias e parei para beber um mojito no mítico bar La Bodeguita, frequentado por turistas e, no tempo que lá viveu, como morador do Hotel Ambos Mundos, pelo grande escritor Ernest Hemingway.

Em casa. Jamelão, a moqueca e as caipirinhas feitas por mim / Foto: acervo pessoal

Quatro caipirinhas para Jamelão

Já contei esta história aqui no blog, em 2019, mas vale relembrar: acordei num domingo qualquer com vontade de preparar uma moqueca e resolvi convidar alguns amigos para o almoço. Tinha acabado de voltar do Mercado Municipal com os ingredientes – entre os quais uma quantidade justa, para não dizer modesta, de camarão – quando o Airton, um dos amigos convidados, me ligou para confirmar a presença e perguntou: “posso levar dois amigos?”.

Assenti, mesmo sabendo que poderia faltar camarão no prato dos comensais. Tudo bem, pensei, vamos caprichar no pirão e na birita. Eis que os convidados começam a chegar, entre eles o Airton e o tal casal. Quando abro a porta… dou de cara com Airton, a Beth e com José Bispo Clementino dos Santos, o Jamelão! Ele mesmo, o célebre intérprete dos sambas da Mangueira em dezenas de carnavais.

Aos (declarados) 92 anos e amparado por uma bengala, Jamelão foi acomodado logo à ponta da mesa. Ofereci a ele cerveja, uísque e acabei por preparar-lhe, ao longo da tarde, quatro caipirinhas. Pelo jeito, Jamelão aprovou.

Caipirinha de caju com pitanga e de mexerica com pitanga do Totò: falam ao coração / Foto: divulgação

As caipirinhas do Totò e as Marias

Por falar em caipirinha, se tem uma que me transmite os melhores sentimentos é aquela que é feita pelo barman Alfredo Martins no Totò, restaurante italiano no bairro do Itaim Bibi, em São Paulo. Aparte a perfeição e o equilíbrio de sabores que Alfredo confere ao drinque, o carinho com quem seleciona, manuseia e corta as frutas, o Totò tem a conveniência de estar instalado a dois quarteirões de distância da Maternidade São Luiz, onde nasceram minhas filhas. Foi ali no balcão do Totò que brindei ao nascimento da mais velha, numa agradável tarde de terça-feira, e aliviei a tensão durante o longo trabalho de parto da caçula, num ensolarado sábado de agosto de 2015.

Quantos dry martini cabem numa garrafa de vermute?

O mesmíssimo endereço na esquina da Alameda Tietê com a Rua Padre João Manuel, nos Jardins, em São Paulo, onde hoje funciona o Cebola Brava, boteco que serve uma feijoada de responsa, abrigou por um breve período, a partir de 2008, um senhor bar: o Dry, onde os barmen Rocha e Kascão serviam impecáveis dry Martini, numa versão em miniatura. O Dry bombava, sob a batuta dos sócios Roberto Suplicy e Germano Fehr, dupla de incomensuráveis serviços prestados à boemia paulistana. Bombava tanto, que a primeira garrafa do vermute Noilly Prat, esvaziou-se em impressionantes quatro meses. Se considerarmos que um dry martini compõe-se de 100 mililitros de gim e três gotas de vermute, foram preparados cerca de 5000 dry Martini no Dry naquele período. E como cheguei a esse número?

Na época editor da VEJA, desci ao ambulatório do edifício da Editora Abril e pedi à enfermeira que introduzisse três gotas de um líquido qualquer em uma seringa de insulina, que tem volume total de 1 mililitro. As três gotas alcançaram 0,15 mililitro, ou seja, cada gota tinha 0,05 mililitro. A partir daí, recorri à matemática: dividi o volume de uma garrafa de Noilly Prat (750 mililitros) pelo volume de uma gota (0,05 mililitro) e cheguei ao resultado de 15000 (gotas por garrafa). Se cada dry Martini leva 3 gotas, dividi 15000 por 3 e cheguei ao número de 5000 drinques por garrafa. O barman Derivan Ferreira de Souza, mestre no preparo do dry Martini, costuma contar essa história nos balcões sobre os quais prepara e serve seus drinques. E lembra da anedota que envolve Harry Craddock, o célebre barman que trabalhou no The Savoy Hotel, em Londres, nos anos 1920. Certa vez, lhe perguntaram: “Por que seus dry Martini são sempre idênticos?”. Craddock respondeu: “Porque minha garrafa de vermute é a mesma há vinte anos”.

Negroni do Setra, em Braga, Portugal: agradável surpresa / Foto: Miguel Icassatti

O negroni improvável

Braga, no norte português, é uma daquelas cidadezinhass que os turistas, sobretudo brasileiros, costumam visitar em combos naquele esquema bate-e-volta a partir da cidade do Porto, em combos que incluem ainda Guimarães, que é o berço de Portugal. Esse turismo expresso, definitivamente, não faz meu tipo. Gosto de passar ao menos uma noite num destino, para colher diferentes impressões, apreciar o pôr-do-sol, ver como é do despertar dos locais. Em geral, somos premiados com uma conversa ou a descoberta de um lugarzinho especial.

Pois foi o que experimentei em Braga, em novembro de 2019, quando tive duas noites livres em meio a compromissos profissionais entre Lisboa e Porto, de onde parti a bordo de um comboio, digo, trem. Hospedei-me num hotelzinho ao lado da estação ferroviária e fui explorar a cidade, que acolhe muitos jovens, aliás, graças ao campus da Universidade do Minho.

Depois do jantar, caminhando pelas ruas vazias do centro histórico, deparei-me com um prédio de dois andares, cujo hall, de portas abertas à rua, exibia uma sala de estar composta por mobília e TV antigas, além de uma placa indicando que havia um bar no piso superior. E que bar: o Setra era o tipo de lugar que jamais pensei encontrar ali. Um speakeasy, com salão repleto de sofás e poltronas e, num ambiente anexo, jovens se enroscavam e desenrolavam em passos de rockabilly e foxtrote. Era uma aula de dança de salão.

Sentei-me em uma confortável poltrona e pedi um negroni. Impecável, o drinque trazia um toque tostado, graças à laranja chamuscada no maçarico. Um gran finale, pelas mãos do barman Elvis.

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Como a resiliência dos botecos e pubs pode nos ensinar a superar a pandemia http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/02/15/como-a-resiliencia-dos-botecos-e-pubs-pode-nos-ensinar-a-superar-a-pandemia/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/02/15/como-a-resiliencia-dos-botecos-e-pubs-pode-nos-ensinar-a-superar-a-pandemia/#respond Mon, 15 Feb 2021 07:00:52 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=901

Bolinhos de carne do Bar do Luiz Fernandes: da zona norte para os supermercados de SP / Foto: divulgação

Os preparativos para a festa de 50 anos do Bar do Luiz Fernandes, o mais tradicional boteco da Zona Norte de São Paulo, seguiam em pleno vapor desde o fim de 2019: o local e as atrações estavam garantidos, os fregueses já começavam a ser informados, os potenciais patrocinadores, contatados; e a data – no mês de mai de 202o -, definida.

Eis que veio a pandemia e, no caso da cidade de São Paulo, o fechamento sumário do comércio no mês de março de 2020. De uma hora para outra, apenas serviços essenciais tiveram autorização para ficar abertos e os comerciantes perceberam-se diante de uma série de questionamentos na condução de seus negócios: vou conseguir pagar os salários da minha equipe? Terei de demitir? Vou ter de aderir ao delivery? Virá alguma ajuda do governo?

Para um boteco de administração familiar, como o Bar do Luiz Fernandes, a pandemia forçou uma verdadeira mudança de paradigmas. Na base da tentativa e erro, em poucos meses a casa implantou serviços que nunca tinha experimentado ao longo das cinco décadas anteriores e tornou concreto o conceito de resiliência, popularizado pelo neuropsiquiatra francês Boris Cyrulnik. Em entrevista recente ao jornalista Fabio de Oliveira, o médico assim definiu o que é resiliência: “é a atitude de um indivíduo de se construir e viver de maneira satisfatória a despeito de circunstâncias traumáticas”.

Mesmo àqueles que não foram contaminados pelo coronavírus, que não perderam familiares para o covid-19 e que conseguiram manter suas atividades profissionais, é possível supor que a pandemia deixará traumas e sequelas. Lidar com a atual situação tem sido algo desafiador para todos nós. Por isso, vale a pena atentar para o exemplo do Bar do Luiz Fernandes. É o próprio Eduardo Fernandes, em depoimento ao blog BOTECLANDO, quem conta a saga do boteco para manter-se vivo durante a pandemia:

“Foi uma loucura: sendo um bar de 50 anos, a gente gosta de rotina, do cliente do dia-a-dia. A gente sabe onde ele gosta de sentar, o que gosta de beber. A gente entende bem isso. Estávamos numa zona de conforto bacana, o bar crescendo, planejando a nossa festa. De repente, parou. Mudou tudo.

Só na matriz são 28 funcionários, uma folha de quase 100.000 reais. Do dia pra noite, ficamos de porta fechada.

Decidimos implantar o delivery mas não tínhamos experiência. Aprendemos na raça: contactamos os apps – ifood e Rappi, que eram a bola da vez. Eles vieram com taxas gigantescas, 25% de comissão. Daí eu falei: “valeu, obrigado”, e criei o nosso próprio aplicativo, com nossa equipe de motoboys. Passou um tempo, os apps perceberam o sucesso e negociaram uma taxa de 10%. Ficou viável, fechamos só com o rappi e o serviço começou a virar. Mas é 30% do faturamento, ajuda a pagar as contas.

Minhas filhas, então, focaram no lançamento da linha de congelados. A cada semana a gente abre um ponto de venda dos nossos bolinhos de carne e de bacalhau congelados: estamos nos maiores supermercados da Zona Norte, nas padarias e fizemos as primeiras entregas na Casa Santa Luzia e na Galeria dos Pães, ambas nos Jardins, e no Pastorinho de Perdizes. É um projeto promissor.

E no salão do bar, a grande sacada foi lançar o PF na hora do almoço porque no nosso formato clássico, de abrir o bar às 4 da tarde e tendo que fechar às 8 da noite, a conta não fechava mais.

Assim, inventamos algo novo, depois de 50 anos, com os PFs: às terças, servimos dobradinha e estrogonofe; quarta, feijoada; quinta: rabada, massa ou picadinho; sexta: arroz de bacalhau. Tudo ao preço médio de 28 reais, do meio-dia às 15h30. Daí emendamos com a happy hour e vamos até 22 horas.

Não tem delivery do PF. Os clientes entenderam a proposta e vêm, curtem o almoço, comem um bolinho ou um pastel antes e com isso o tíquete já aumenta. O público do almoço não é o da pegada da zoeira, é mais calmo: pede o prato, se acomoda, tem o tom de voz mais baixo e a mesa gira mais rápido, em média com 1 hora.

Eduardo Fernandes, do Bar do Luiz Fernandes: todo dia um vídeo no what’s app para anunciar o PF / Foto: reprodução

Estamos muito felizes, não vamos parar com os PFs quando voltarmos à normalidade. Vou adequar os horários: em vez de fechar meia noite, vamos encerrar às 23h; em vez de abrir às 4 da tarde, vamos começar ao meio-dia.

A gente levanta esta bandeira: o Boteco não é sinônimo de bebida; é a comida que faz a diferença. Hoje, o comerciante que não tiver visão, que não sair da zona de conforto, não se adequar, infelizmente vai fazer seu negócio morrer. Até julho, teremos muita restrição mas quando chegar setembro e outubro a economia vai retomar. Vamos superar isto aí, vai achar um caminho”.

Se por um lado temos o bom exemplo do Bar do Luiz Fernandes, infelizmente, no Brasil e mundo afora muitos botecos e restaurantes não tiveram essa oportunidade ou, como diz Eduardo Fernandes, “essa visão”. Ainda assim, há experiências positivas, que têm como pano de fundo o engajamento da clientela no sentido de valorizar e consumir produtos dos comerciantes locais, seja por meio do delivery, seja por meio de novos serviços que os bares tiveram de implantar.

No Reino Unido, por exemplo, alguns pubs tiraram coelhos da cartola: o pequeno e familiar The Red Lion Inn, no vilarejo de Shobrooke, passou a vender kits com produtos de mercearia, comprados de pequenos produtores locais. Com lockdown e restrições de circulação, essa iniciativa acabou por atender populações mais vulneráveis, como idosos, que antes tinham de percorrer alguns quilômetros até uma cidade vizinha, onde fica o supermercado mais próximo. O pub virou o mercadinho da vila, com serviço de entrega em casa.

Newsletter da Pub is The Hub: incentivo aos pubs para reinevntarem seus negócios / Foto reprodução

Essa iniciativa britânica, aliás, teve o suporte da Pub Is The Hub, uma espécie de ONG que tem como missão incentivar os pubs e pequenas cervejarias artesanais a encontrarem novas soluções de negócios e serviços a fim de manter os bares vivos. Dessa forma, mais do que servir uma boa cerveja acompanhada de uma porção de fish’n chips, os pubs acabam por atender outras necessidades dos fregueses. Afinal, um bom boteco e um bom pub conhecem bem a sua freguesia.

 

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Não é o Doria: o que eu e você podemos fazer para que os bares não morram? http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/01/30/nao-e-o-doria-o-que-eu-e-voce-podemos-fazer-para-que-os-bares-nao-morram/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/01/30/nao-e-o-doria-o-que-eu-e-voce-podemos-fazer-para-que-os-bares-nao-morram/#respond Sat, 30 Jan 2021 07:00:05 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=888

Para que bares e restaurantes não fechem, é preciso ação conjunta – e até mudança de hábitos

Na quarta-feira, 27 de janeiro, um grupo de cerca de 300 empresários e trabalhadores do segmento de bares e restaurantes realizou uma manifestação pacífica na Avenida Paulista, em São Paulo, contra as medidas mais restritivas de circulação, determinadas pelo Plano São Paulo, a autointitulada “estratégia do Governo do Estado para vencer a covid-19, baseada na saúde e na ciência”. Foi a segunda manifestação do setor em cinco dias: no dia 22, uma quantidade menor de gente havia protestado nos arredores do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo do estado de São Paulo. Essas ações, assim como a campanha nas redes sociais “Não nos confundam”, que faz referência aos bares e restaurantes que vêm seguindo os protocolos e, portanto, não estariam espalhando o coronavírus, foram organizadas pelo Movimento Gastronomia Viva e têm apoio da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) e da ANR (Associação Nacional de Restaurantes).

Não há dúvidas de que os negócios da “alimentação fora do lar”, ou seja, os bares, restaurantes, cafés, padarias e congêneres formam um segmento da economia que está entre os mais afetados pela pandemia, depois apenas, talvez, da saúde pública. O alvo preferencial dos apoiadores do movimento vem sendo o governador do estado, João Doria, que a todo momento se diz amparado pelo comitê de especialistas em saúde para embasar suas decisões, como a mais recente, a de restringir os horários de funcionamento de bares e restaurantes de segunda a sexta até 20 horas e, nos fins de semana, somente com atendimento via delivery.

O problema não é o Doria. Ou, ok, não é apenas o Doria. Na mesma linha do colega paulista, o governador do Pará, por exemplo, anunciou ontem novas restrições naquele estado. E é preciso dizer que o comitê de especialistas do governo de São Paulo vem defendendo um lockdown faz tempo. Voz dissonante, eu também defendo. Ontem foi o terceiro dia com mais mortes por covid-19 no país. Diferentemente do presidente, eu estou com medo de morrer ou de perder gente querida. É um momento que exige sacrifício de todos.

A meu ver, a questão dos bares e restaurantes é muito mais complexa do que uma simples canetada doriana poderia solucionar. Envolve muitos partícipes, tão próximos e tão distantes ao mesmo tempo uns dos outros, que insistem em mergulhar no próprio bolso cada vez mais furado em vez de segurar a mão de quem está ao lado para, juntos, buscar alguma solução para os problemas. Bom, já que estou apontando o dedo para muita gente, endereço meu indicador para alguns:

E se o Doria e os outros governadores reduzissem temporariamente tributos estaduais que incidem diretamente nos produtos e insumos utilizados por bares e restaurantes, em especial o ICMS?

E se o ministro Paulo Guedes topasse atender aos três pedidos levados até ele pelos representantes do setor, em reunião ocorrida esta semana? A saber: 1. Extensão do BEM, programa de preservação de emprego e renda, que permite a redução de jornada de trabalho e de salário; 2. Prorrogação da carência do Pronampe (programa de crédito para pequenas empresas); 3. Manutenção dos estabelecimentos inadimplentes no Simples, já que que mais de 60% deles não tem recursos para pagar os impostos atrasados até o fim de janeiro. Se não o fizerem, migram para um regime de tributação mais alta. Hoje, no Simples, pagam 11%. Em outro regime, só de INSS seriam 27,5%.

E se a Abrasel e a ANR se juntassem às associações comerciais dos estados e à Confederação Nacional do Comércio para unir esforços em favor das reivindicações?

E se o prefeito Bruno Covas assim como os prefeitos dos outros 5569 municípios resolvessem dar um bom desconto e/ou postergar o pagamento do IPTU dos estabelecimentos neste ano de 2021?

E se os órgãos responsáveis pela fiscalização dos protocolos aumentassem sues efetivos e fossem rigorosos e ágeis na identificação e na punição dos estabelecimentos que estão furando as regras de combate à pandemia?

E se as empresas de bebidas proibissem os distribuidores e representantes de vender seus produtos para os produtores, promotores de eventos e casas noturnas que sabidamente organizaram e continuam organizando festinhas clandestinas?

E se as mesas no Vaca Véia, no Itaim Bibi, fossem redistribuídas no salão para, de fato, guardar a distância de 2 metros entre si e de 1,5 metro entre os clientes?

E se o Isaac Azar orientasse seus funcionários do Paris6, nos Jardins, em São Paulo, a organizar a fila de espera de modo que os clientes guardem distanciamento físico?

E se a turma do Tuy, também no Itaim Bibi, recusasse o pedido de alguns clientes para dar um jeitinho e colocar mais uma cadeira na mesa já ocupada por seis pessoas, o limite autorizado no momento?

 

Acarajé de mão do Rota do Acarajé / Foto: Leo Feltran

 

E se mais donos de bares e restaurantes aderissem à excelente ideia da campanha “Jante às 18h”, que já tem adeptos como o Piselli, do restaurateur Juscelino Pereira, nos Jardins, o Chez Vous, em Moema, e a Rota do Acarajé, em Santa Cecília? Em outros lugares do mundo, como Nova York, algumas cidades da Itália e na Alemanha, por exemplo, esse é um hábito muito comum. No caso do Piselli, tanto nos Jardins quanto no Shopping Iguatemi, é possível chegar às 17h, pedir um drinque – o aperitivo é por conta da casa – e emendar o “jantar ao pôr-do-sol”, que, por sua vez, terá o vinho como cortesia.

E se, nós clientes, aderíssemos à ideia de jantar às 6 da tarde?

E se os aplicativos de entrega reduzissem a taxa de 27% em média, que cobram dos bares e restaurantes, sobretudo os pequenos? Melhor: e se cobrassem uma taxa única, mais baixa; independentemente do porte dos estabelecimentos?

E se os entregadores tivessem um desconto no IPVA de suas motos?

E se as concessionárias de serviços de gás e energia reduzissem o valor cobrado em suas contas?

E se nós clientes respeitássemos as regras ou boicotássemos os bares e restaurantes que não estão nem aí?

E, que tal, se todos nós sentássemos à mesa virtual do Zoom e colocássemos essas e outras perguntas em debate? Quem quiser vir, é só chamar: miguel@culturadeboteco.com.br.

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10 receitas que provam que São Paulo é a cidade que come de (quase) tudo http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/01/29/10-receitas-que-provam-que-sao-paulo-e-a-cidade-que-come-de-quase-tudo/ http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/2021/01/29/10-receitas-que-provam-que-sao-paulo-e-a-cidade-que-come-de-quase-tudo/#respond Fri, 29 Jan 2021 07:00:04 +0000 http://boteclando.blogosfera.uol.com.br/?p=884 Houve um tempo em que o paulistano era chamado de caipira, e não era por seu sotaque ou por causa das roupas que vestia. “O general Couto de Magalhães registrou em meados do século XIX manifestações satíricas de estudantes contra o hábito alimentar das elites de São Paulo, que comiam içá e cambuquira e, por isso, eram chamados de caipiras”, contam o sociólogo Carlos Alberto Dória e o chef Marcelo Corrêa Bastos no ótimo livro “A culinária caipira da Paulistânia – A história e as receitas de um modo antigo de comer” (Editora Três Estrelas, 2018).

Quase dois séculos depois, os sotaques do paulistano são muitos, assim como a moda vista pelas ruas de São Paulo é uma miríade de estilos – será que existe um jeito paulistano de se vestir? A pensar.

Na alimentação, na gastronomia, a cidade que completou essa semana 467 anos deixou para trás qualquer complexo de caipiranidade. Em São Paulo, bebe-se, come-se e faz-se de tudo com os ingredientes disponíveis; paulistanizam-se receitas, melhorando-as ou piorando-as, tudo depende do ponto de vista.

O barman Paulo Leite, por exemplo, foi o campeão do segundo campeonato brasileiro de Rabo de Galo em 2018, a colocar entre os ingredientes de sua receita uma içá, a “rainha da formiga saúva”. Fui jurado desse certame e, além de degustar o RG campeão, pude comer a formiga e perceber seu sabor salgado, com toque cítrico, de limão siciliano, conforme contei neste texto.

O Rabo de Galo, aliás, é uma das 10 maravilhas da culinária e da botecagem paulistanas, nascidas em São Paulo ou trazidas de outras partes do país e do mundo ao gosto de quem vive na cidade. Porque, como escreveu a cearense Raquel de Queiroz em 1954: “nunca houve recanto do Brasil que fosse mais Brasil do que São Paulo”:

  1. Rabo de galo:

A mistura de cachaça com vermute foi criada nos anos 1950, quando a indústria italiana de bebidas Cinzano chegou a São Paulo. Para popularizar o consumo de seu produto, a empresa inventou o drinque e atribuiu-lhe o nome que alude à tradução de coq (galo, do francês) e tail (rabo, do inglês)

  1. Sanduíche de mortadela:

Sanduíche de mortadela do Mortadela Brasil, no Mercado Municipal: 300 gramas de recheio / Foto: Airton Gontow

O sanduíche de mortadela não foi inventado em São Paulo, certamente, mas o exagero com que é preparado nos bares do Mercado Municipal Paulistano me faz lembrar da crônica Adamastor e São Paulo”, do grande Antônio Maria: “Sobre São Paulo (…) os homens, mesmos se ser grandes, se chama m de Carlão, Luizão e Zelão”. Nada mais paulistano do que os aumentativos e as 15 fatias que, em média, compõem os 300 gramas do sanduíche de mortadela do Hocca Bar, do Mortadela Brasil e do Bar do Mané, entre outros.

  1. Coxinha com catupiry:

    Coxinha do Frangó / Foto: divulgação

Talvez existam tantas receitas diferentes de coxinha quanto são as pet shops ou as padarias em São Paulo. Mas não há dúvida de que a brilhante ideia de adicionar uma fina camada de catupiry entre a massa e o recheio de sua coxinha, fez do FrangÓ, na Freguesia do Ó, um dos endereços obrigatórios para os fãs do salgado.

  1. Cachorro-quente (aka dogão):

É certo que no espaço que sobra entre as duas bandas do pão e a salsicha cabe de tudo um pouco: molho vinagrete, maionese, ketchup, mostarda, batata palha, ervilha, milho, carne moída. Mas dogão paulistano raiz que se preze pode dispensar boa parte desses itens listados acima para dar espaço, no lugar, um bom purê de batata. Além de agregar sabor, o purê, que deve ser colocado por último, tem a função de evitar que os outros ingredientes caiam do lanche e lambuzem a mão da gente. Nunca vou esquecer no dogue do Serginho, que eu comia quase todos os dias na Rua Monte Alegre, na porta do prédio velho da PUC, nos meus tempos de estudante de jornalismo.

  1. Chipa paraguaia:

A moda é recente. Salgado típico do Paraguai e da fronteira desse país com o Mato Grosso do Sul, a chipa começou a aparecer nas padarias paulistanas há uns quatro, cinco anos. Esse biscoito feito com queijo e polvilho tem, originalmente, consistência mais massuda, às vezes farinhenta. Mas em São Paulo foi paulistanizada: tem uma consistência mais próxima a de um pão de queijo genérico e perdeu a adição da erva-doce, o que é uma pena.

  1. Caipirinha de vodca

Certa vez, o barman do La Bourse, o lindo e antigo bar da Bolsa de Valores de São Paulo, contou-me que, nos anos 1970, muitos bares recusavam-se a preparar a caipirinha com cachaça. Tinham vergonha da qualidade do destilado, segundo ele. Razão pela qual muitos trocaram a aguardente pela vodca. Felizmente a oferta de marcas e estilos de cachaça nos bares paulistanos é ótima. Só resta aos barmen engavetarem a réplica ainda comum quando o cliente lhes pede o drinque: “com vodca ou cachaça?”. Caipirinha é sempre feita com cachaça.

  1. Arais:

Arais do Carlinhos / Foto: Leo Feltran

É das coisas mais saborosas que as cozinhas paulistanas já inventaram. No caso, a cozinha do restaurante Carlinhos, na divisa do Brás e do Pari. Trata-se de um sanduíche composto de uma cafta prensada no pão árabe, levada à chapa. Foi criado por acaso pelo saudoso Missak Yaroussalian, ao fim de um dia de expediente. Sozinho na cozinha do seu pequeno restaurante, então na Rua Miller, ele improvisou um lanche com o que tinha mais a mão: justamente um pão e um pouco de carene temperada para cafta. Levou à chapa e assim nasceu o arais.

  1. Joana D’Arc:

É uma calabresa flambada na cachaça, geralmente servida com rodelas de pão e molho vinagrete. A receita teria sido criada n’A Juriti (Cambuci) mas é bem feita também no Jabuti (Vila Mariana), no Elídio Bar, da Mooca, ô meu.

  1. Sushi de salmão:

Esta quem me contou foi o Jun Sakamoto, célebre sushiman: no Japão não se come sushi de salmão. Trata-se de uma invenção paulistana. Segundo ele, a grande diversidade de peixes na costa japonesa permite o emprego de diversas espécies em sushis e sashimis – inclusive do fugu (baiacu). Sakamoto disse-me que os orientais preferem grelhar o salmão, em vez de servi-lo cru. Encontrado sazonalmente na costa de Hokkaido, no norte do Japão, o salmão migra do oceano para os rios, onde acaba contraindo impurezas. Salvo o que acontece em algumas regiões isoladas, em que se consome sushi de carpa, o japonês não come peixe cru de água doce.

  1. Pizza de tudo:

A pizza chegou ao Brasil com os imigrantes vindos de Nápoles, no sul da Itália, poucas décadas depois de seu surgimento, em 1889, quando o pizzaiolo Raffaele Espósito ofereceu à rainha Margherita uma cobertura feita com mussarela, tomate e manjericão, em alusão às cores da bandeira da Itália. Se naquele país a pizza é um prato passível de adaptações regionais, em função dos ingredientes disponíveis – aliche, atum e frutos do mar cobriam os discos da região mais mediterrânea, enquanto nos bosques e montanhas da Toscana e do Piemonte a pizza ganhou o sabor do funghi, conforme lembra o italiano Vincenzo Buonassisi em O Livro da Pizza –, em São Paulo come-se pizza de tudo o que é sabor, com massa de fermentação natural ou não, com borda recheada e espessura mais fina, média ou grossa, assada em fornos a lenha, a gás ou elétrico. Mas o que é importante: com ketchup, nunca. Jamais.

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